Dentre os 5 sentidos do ser humano, ouvir é o único sentido capaz de ser restaurado através de uma tecnologia semi implantável: o Implante Coclear (IC).
Para comemorar este grande marco, dia 25 de Fevereiro é considerado o Dia internacional do Implante Coclear, pois foi o dia do primeiro teste de implante auditivo em uma pessoa, pelos médicos franceses Djuorno e Eyres, em 1957.
Já no Brasil, O primeiro implante coclear monocanal, foi realizado pelo Prof. Dr. Pedro Mangabeira Albernaz, em São Paulo, em outubro de 1977 (Mangabeira Albernaz, 2015).
Anos após, na década de 1990, a primeira cirurgia de implante coclear multicanal foi realizada em Bauru, pelo Prof. Dr. Orozimbo Alves Costa e equipe.
Ainda em 1990, o Prof. Dr. Ricardo Ferreira Bento juntamente com a equipe da Bioengenharia do Instituto do Coração do HCFMUSP e com a colaboração da Disciplina de Otorrinolaringologia da FMUSP, deu iniciou a fabricação do primeiro implante coclear nacional. Pacientes foram implantados com sucesso e duas patentes foram geradas (Bento, 2015).
Muitos centros/hospitais de referência do Sistema Único de Saúde começaram a realizar as cirurgias de implante coclear, a partir da Portaria Nº 1.278/GM de 20 de outubro de 1999 (Revogada pela PRT GM/MS n° 2.776 de 18.12.2014), que “aprova diretrizes gerais, amplia e incorpora procedimentos para a Atenção Especializada às Pessoas com Deficiência Auditiva no Sistema Único de Saúde (SUS)” e tornou obrigatória a cobertura do implante coclear desde que o serviço esteja habilitado.
Já no setor privado (convênios médicos), o Rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar de 2016 garante a cirurgia uni ou bilateral para os casos que estiverem dentro dos critérios de indicação.
Portanto atualmente, no Brasil, temos a cobertura tanto no setor privado e quanto no público, uni ou bilateral, crianças e adultos (de acordo com os critérios de indicação).
O QUE É O IMPLANTE COCLEAR?
O implante coclear (ou ouvido biônico como é popularmente conhecido) é um dispositivo eletrônico, semi implantável e que possui 2 partes: o componente interno e o componente externo (imagem 1).

Fonte: Oticon Medical
O componente interno é inserido cirurgicamente por um médico otorrinolaringologista com experiência e capacidade técnica para o cuidado clínico e cirúrgico (Ministério da Saúde, Portaria 2776).
Todos os modelos de implante coclear do mercado, possuem componentes em comum:
- um feixe de eletrodos (imagem 2 – item 1) em que a ponta é inserida na cóclea;
- um receptor estimulador (imagem 2 – item 2) que irá transformar o som em sinal elétrico;
- uma bobina (imagem 2 – item 3) que recebe o sinal sonoro através da antena do componente externo;
- um imã (imagem 2 – item 4) que se faz necessário para a fixação com a parte externa;
- um eletrodo de referência para captação do potencial de ação e um eletrodo de referência para captar e enviar a estimulação para os pontos de contato (alguns modelos, os eletrodos de referência estão no próprio receptor estimulador e outros estão dispostos separadamente).

Fonte: Advanced Bionics
O feixe do eletrodo é inserido na cóclea e é o responsável por transmitir a informação auditiva ao nervo auditivo. Cada ponto de contato introduzido na cóclea (varia de 12 a 22 eletrodos – depende da marca do implante) é divido por bandas de frequências que são responsáveis por transformar o som captado em informação elétrica, substituindo as células ciliadas na nossa orelha interna.
Existem diferentes tipos de feixe de eletrodos no mercado atual: eletrodo reto (parede lateral – imagem 3), eletrodo perimodiolar (imagem 4) e o eletrodo de escala média (imagem 5). O médico cirurgião que irá definir qual o melhor tipo de eletrodo para cada caso.

Fonte: Advanced Bionics

Fonte: Cochlear Corporation

Fonte: Advanced Bionics
COMO É A CIRURGIA?
A cirurgia de implante coclear é realizada por um médico Otorrinolaringologista (e assistentes) em um hospital com instrumentos específicos para cirurgia de ouvido. O Ministério da Saúde, através da portaria 2776, disponibilizou os materiais mínimos para a realização de uma cirurgia e esta lista pode ser encontrada em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2014/prt2776_18_12_2014.html
A cirurgia pode ser realizada sob anestesia geral ou anestesia local (Hamerschmidt et al. 2010). O tempo cirúrgico depende de vários fatores como anatomia do paciente, patologia da perda auditiva, experiência da equipe, entre outros. Em média, é um procedimento que pode levar em torno de 2 a 4 horas em uma cirurgia unilateral (se não for um caso complexo) e no caso de uma cirurgia bilateral (as duas orelhas no mesmo dia) pode chegar entre 4 a 8 horas.
Após a inserção do feixe de eletrodo, o Fonoaudiólogo da equipe realiza dois testes que são exames fundamentais e de muita importância para o seguimento do procedimento cirúrgico e a sua conclusão: a telemetria de impedância e a telemetria neural.
A telemetria de impedância avalia o funcionamento eletrônico do dispositivo (imagem 6) e a telemetria neural a resposta do potencial de ação do nervo auditivo (imagem 7).


Em seguida a equipe médica poderá solicitar um exame de imagem para avaliar o posicionamento do feixe de eletrodos na cóclea (imagem 8).

O paciente poderá ter alta no mesmo dia ou ficar uma noite no hospital (decisão médica). Os detalhes da cirurgia devem ser conversados com o médico especialista.
ATIVAÇÃO E MAPEAMENTOS
A ativação (momento em que o processador de áudio é ligado) ocorre em média, 30 dias após a cirurgia. O Fonoaudiólogo é o profissional responsável pela ativação e mapeamentos do implante coclear, além da reabilitação auditiva (terapia com o dispositivo).
O componente externo é conhecido como processador de áudio ou processador de som (imagem 9) e é capaz de captar os estímulos sonoros do meio ambiente e enviá-los para o componente interno.

Fonte: Cochlear Corporation
Os microfones captam os estímulos sonoros (Imagem 10 – item 1 e 2) e através da antena, conectada ao componente interno por um imã (Imagem 10 – item 3), enviam a informação sonora através de rádio frequência para o componente interno, responsável por enviar o estímulo sonoro ao nervo auditivo (Imagem 10 – item 4).

Fonte: Advanced Bionics
Atualmente, existe 2 modelos de processador de áudio: BTE (Behind The Ear – atrás da orelha – imagem 11) e OTE (Out The Ear – fora da orelha – imagem 12)

Fonte: MED-EL

Para realizar a ativação e os mapeamentos, é necessária uma interface de programação, um computador e o processador de áudio (Kit do paciente).
As medidas objetivas frequentemente são realizadas para testar o funcionamento eletrônico do componente interno após a cirurgia e durante os mapeamentos. As medidas mais utilizadas na prática clínica são as mesmas medidas do intraoperatório: telemetria de impedância: funcionamento eletrônico do dispositivo; telemetria neural: resposta do potencial de ação do nervo auditivo.
Outras medidas objetivas podem ser realizadas como: ESRT (Electrically Evoked Stapedial Reflex Thresholds – Limiares de reflexo estapediano evocados eletricamente) e EABR (Electric Auditory Brainstem Response – Resposta elétrica auditiva do tronco cerebral) porém são necessários equipamentos extras de imitanciometria e de potencial evocado auditivo.
Durante a pesquisa dos níveis de conforto e nível mínimo de resposta, deve-se avaliar a idade do paciente, a experiência auditiva anterior e entendimento para as ordens a serem dadas. Podemos utilizar as medidas objetivas e associá-las as medidas subjetivas e assim, determinamos a área dinâmica elétrica do implante coclear (imagem 13).

No primeiro ano de implante, a periodicidade dos mapeamentos é mais frequente, já que precisamos avaliar e validar o desempenho do paciente com o dispositivo.
Normalmente o mapeamento é realizado 1 mês após a ativação, + 3 meses, + 3 meses, + 6 meses, + 6 meses e 1 vez por ano. Essa periodicidade pode ser revisada de acordo com o caso e necessidade audiológica.
O implante coclear sozinho, não faz milagres! É de fundamental importância para o sucesso da cirurgia, a aliança entre a fonoaudióloga que realiza o mapeamento e a fonoaudióloga que realiza a terapia, já que o implante irá ajudar a audibilidade, mas é necessário treino as habilidades auditivas para o sucesso da inteligibilidade.
A motivação e expectativa do paciente e da família também fazem parte do processo e são importantes desde a etapa pré cirúrgica.
INDICAÇÕES E CONTRAINDICAÇÕES DO IMPLANTE COCLEAR
O implante coclear é indicado para pacientes com perda auditiva de grau severo/profundo bilateral onde o aparelho auditivo não fornece o benefício necessário para que o indivíduo apresente uma boa audibilidade para os sons da fala. Esse benefício deve ser avaliado por meio de testes específicos.
A equipe que realiza a indicação (ou contraindicação) do implante coclear é uma equipe multidisciplinar e é composta por Otorrinolaringologista, Fonoaudiólogo, Psicólogos, Assistentes Sociais, Geneticistas, Anestesiologistas, entre outros profissionais da área da saúde e são os responsáveis por avaliar cada caso.
A descrição dos critérios de indicação e contraindicação do implante coclear pode ser conferida nos seguintes endereços eletrônicos:
- Ministério da Saúde (Diretrizes Gerais)
- ABORL (Associação Brasileira de Otorrinolaringologia)
- DIRETRIZES DE UTILIZAÇÃO PARA COBERTURA DE PROCEDIMENTOS NA SAÚDE SUPLEMENTAR – 2018
http://www.ans.gov.br/images/ANEXO/RN/Anexo_II_DUT_Rol_2018_alterado.pdf
MARCAS E MODELOS
É importante o professional saber identificar quais as particularidades de cada empresa para apresentar ao paciente no momento da decisão da marca do IC.
Cada marca de implante coclear tem a sua especificação e é importante que a equipe saiba a respeito de todas as marcas e disponibilize para o paciente informações sobre as 4 marcas comercializadas no Brasil.
As empresas disponibilizam materiais para download em seus sites. Para saber mais informações acesse:
Advanced Bionics: https://advancedbionics.com/br/pt_br/home.html
Cochlear: https://www.cochlear.com/br/pt/home
MED-EL: https://www.medel.com/pt-br/
Oticon Medical: https://www.oticonmedical.com/portuguese
Todas as imagens utilizadas neste artigo estão disponíveis na internet e foram referenciadas as determinadas empresas logo abaixo das mesmas.
Todas as soluções auditivas apresentadas são as que estão disponíveis no Brasil até o mês de janeiro de 2021.
BIBLIOGRAFIA E FONTES CONSULTADAS
- Associação Brasileira de Otorrinolaringologia – Critérios de indicação e contraindicação do implante coclear disponível em:
- http://www.aborlccf.org.br/imageBank/CRITERIOS-DE-INDICACAO-E-CONTRAINDICACAO-DO-IMPLANTE-COCLEAR-FINAL.PDF [acesso em 27/01/2021]
- Advanced Bionics: https://advancedbionics.com/br/pt_br/home.html [acesso em 24/01/2021].
- Bento RF. Addendum to the history of cochlear implants in Brazil. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81:576.
- Cochlear: https://www.cochlear.com/br/pt/home [acesso em 25/01/2021].
- Hamerschmidt R, Mocellin M, Gasperin AC, Faria JLG, Trevizan G, Wiemes GRM, Kutianski V. Local anesthesia for cochlear implant surgery: a possible alternative. Braz J Otorhinolaryngol. 2010;76(5):561-4.
- Mangabeira Albernaz PL. History of cochlear implants. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81:124-5.
- MED-EL: https://www.medel.com/pt-br/ [acesso em 25/01/2021].
- Ministério da Saúde – Diretrizes gerais para a atenção especializada ás pessoas com deficiência auditiva no Sistema Único de Saúde, disponível em:
- http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_gerais_atencao_especializada_pessoas_deficiencia_auditiva_SUS.pdf [acesso em 23/01/2021]
- Ministério da Saúde – Portaria 2776 de 18 de dezembro de 2014, disponível em:
- http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2014/prt2776_18_12_2014.html [acesso em 23/01/2021].
- Oticon Medical: https://www.oticonmedical.com/portuguese [acesso em 25/01/2021].
- Rol de procedimentos da ANS disponível em: http://www.ans.gov.br/images/ANEXO/RN/Anexo_II_DUT_Rol_2018_alterado.pdf [acesso em 27/01/2021] .
