A Interpretação Forense e suas peculiaridades

A LIBRAS no Campo Jurídico

Embora pouco conhecida e estudada aqui no Brasil, a Interpretação Forense é um divisor de águas entre o réu e o juiz, é ela que fará toda a diferença entre a liberdade ou absolvição, sentença maior ou menor isso sem demagogia, ou exageros.

A Interpretação Forense é uma ferramenta legal que garante a defesa do réu durante o processo penal, e a Constituição Federal exige que seja oportunizado ao réu o direito à ampla defesa, e que seja passivo de compreensão ao réu estrangeiro o que acontece durante o processo penal brasileiro.

O código de Processo Penal estabelece que  “quando a testemunha não conhecer a língua nacional, será nomeado intérprete para traduzir as perguntas e respostas” (art.223).  No caso dos surdos, o código Penal brasileiro diz: “ao surdo serão apresentadas por escrito as perguntas, que ele responderá oralmente; ao mudo as perguntas serão feitas oralmente, respondendo-as por escrito; ao surdo-mudo as perguntas serão formuladas por escrito e do mesmo modo dará as respostas” “caso o interrogando não saiba ler ou escrever, intervirá no ato, como intérprete e sob compromisso, pessoa habilitada a entendê-lo” “quando o interrogando não falar a língua nacional, o interrogatório será feito por meio de intérprete”. Considerando que o Código de Processo Penal Brasileiro é de 1941, sabemos que a realidade dos surdos é completamente diferente da descrita aqui, principalmente ao se tratar de sua compreensão leitora e escrita. Como já é do conhecimento de muitos, a língua primeira dos surdos é a Libras, o português como segunda língua na modalidade escrita, porém, muitos surdos não têm domínio do português escrito e necessita de um intérprete/tradutor para ambos os casos.

A interpretação Forense é uma área muito específica e requer treinamento e habilidades particulares para este fim. O Intérprete, com o propósito  de aperfeiçoar sua prática, direciona sua vida ao aprendizado constante, uma dedicação voltada para vocabulário, e terminologia para atender cada audiências de forma singular. É um caminho sem volta e constante, a língua muda, a terminologia muda, os sinais mudam, nos forçando assim a estar conectados com a língua de chegada e/ou partida. 

“Dominar técnicas de interpretação é um dever de ofício, mas se os intérpretes não aplicá-las em conformidade, devido a qualquer um dos fatores humanos, então alguns problemas serão sempre deixados sem solução” (NORDIN, 2018, p.8).

O intérprete Forense, profissional, que se dedica a fazer este trabalho, não o faz de forma esporádica ou como um passa tempo. Esta é uma profissão que requer dedicação e treinamento profundo da teoria com a prática. Requer um desempenho altamente preciso, para isso é necessário que o seu nível de treinamento seja o mais alto possível, não possibilitando falhas. 

Em países mais desenvolvidos, o treinamento é oferecido por profissionais que atuam direta e diariamente nos fóruns de justiça; existem provas e certificações obrigatórias fazendo da profissão uma incansável busca pelo saber. 

No Brasil muito se fala sobre interpretação de conferência, ficando limitado a esta esfera, o que é muito prejudicial, visto que são interpretações bem distintas, assim como a interpretação na área médica, algo que precisa ser amplamente estudado, mas o fato é que estamos muito atrasados em relação a outros países, em pelos menos dez anos. Ainda estamos em busca da terminologia correta, dos sinais próprios para o campo jurídico, que ainda estão em fase de criação e desenvolvimento, e com base nessa pequena reflexão, a interpretação forense além de uma atividade profissional, é uma atividade inerente dos intérpretes que atuam em audiências, elas da área cível ou criminal, e reafirmo que esta atividade em específico não pode ser desenvolvida por qualquer pessoa que se diz falante de língua de sinais, é necessário um amplo e aprofundado de técnicas de interpretação, bem como estreiteza, desembaraço e agilidade com as terminologias da área jurídica e também com rituais atuais do direito. É importante citar que o profissional intérprete Forense precisa ter um controle emocional muito grande, às vezes é necessário saber qual seu limite antes de aceitar a interpretação na esfera jurídica.

“É preciso manter uma familiaridade com a língua e a cultura, para ser capaz de cumprir com os padrões aceitáveis de qualidade da interpretação” (NORDIN, 2018, p.9).

Deste modo, quero deixar bem claro que a interpretação Forense é real, mais comum do que se imagina, e os intérpretes de Libras, em alguns casos, não estão preparados para lidar com essas situações e infelizmente o curso e aperfeiçoamento para este profissional é muito escasso. Não existe espaço para o erro, reformulações do discurso, para o “eu acho”, é necessário ter 100% de certeza para não haver perda de autenticidade da mensagem do réu para os advogados, promotores e juízes que estarão atuando no caso. Haverá réus dos mais diversos níveis de ensino, e as mensagens devem ser transmitidas fielmente até mesmo no caso de níveis educacionais mais baixos.

“Intérpretes forenses não seriam intérpretes se julgarem-se isentos de sua parte de responsabilidade. Eles devem aplicar os princípios profissionais gerais de boa prática e manter a integridade acima de tudo” (NORDIN, 2018, p.8).

Quando digo treinamento específico, me refiro para a fala, para ouvir, para anotações quando se fizer necessário, para transmitir a mensagem, para se fazer ser ouvida, formas de se referir ao magistrado, é muito mais complexo do que se pode imaginar. Além da proficiência na língua de origem para a Libras ou outra língua gestual visual de outro país, há habilidades específicas que precisam ser aprendidas antes de se aventurar a atuar em uma Tradução Forense.

“Se é certo que nem todo bilíngue pode, só por isso, ser intérprete, não menos certo é que todo intérprete está preparado, com sua formação genérica, para servir como intérprete forense” (NORDIN, 2018, p.4).

Saber interpretar eximiamente, é realmente maravilhoso, mas se falta o ‘item’ principal, ou seja, a habilidade técnica para a finalidade, de nada vale.

O Brasil vem caminhando, e espera-se que a passos largos no que diz respeito ao intérprete Forense certificado e qualificado, tendo em mente que a qualificação é um processo de “educação continuada”. Como, por exemplo, no código da APILRJ – Associação dos Profissionais Tradutores/Intérpretes de Língua Brasileira de Sinais do Rio de Janeiro, há um capítulo inteiro (Capítulo VIII) versando sobre a necessidade de desenvolvimento profissional, com a busca de educação superior e capacitação contínua. (CARNEIRO, 2018).  Esse exemplo podemos ver em países desenvolvidos e em desenvolvimento. Outro fator que é importante lembrar é que a profissão não é regulamentada no Brasil, então qualquer bilíngue com “treinamento” adequado ou não, pode realizar o trabalho. No entanto, mais importante que treinamento é respeitar a regulamentação e o código de ética que regem uma profissão, se você não se encaixa nos padrões e nas normas técnicas exigidas, não aceite o trabalho.

“Ser bilíngue não significa que você pode ser Intérprete” (NORDIN, 2018, p.4).

Então, concluo que ainda que você tenha um mestrado, doutorado ou pós-doutorado em tradução, estudos da tradução ou linguística, não assegura que você desempenhará um bom trabalho como Intérprete Forense se não adquirir habilidades técnicas específicas para este fim.

NORDIN, J. N. Introdução à Interpretação Forense no Brasil. Editora Transitiva, 2018.

Profissional – APILRJ – Associação dos Profissionais Tradutores/Intérpretes de Língua Brasileira de Sinais do Rio de Janeiro. Acesso em 10/06/2022: https://pt.scribd.com/document/274141845/Codigo-de-Etica-APILRJ;

CARNEIRO, T. D. O Papel dos Códigos de Ética e Conduta Profissional na Formação do Intérprete de Línguas orais e de Sinais no Brasil. Porto Alegre, Junho de 2018. 

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