Do outro lado da mesa: Como a fonoaudiologia mudou minha vida

Olá, leitor! Meu nome é Gabriel, tenho 24 anos e sou surdo oralizado, ou seja, nasci ouvinte e em algum momento da minha vida desenvolvi a surdez. Isso aconteceu em 2017, quando eu tinha 19 anos. Tive uma surdez súbita, literalmente dormi ouvindo e acordei surdo. Nessa época eu cursava Direito e nem imaginava o tamanho da comunidade e diversidade surda.

Antes da surdez eu sempre tive uma saúde perfeita, até um resfriado era difícil de eu “pegar”, eu fazia alguns checkups médicos, mas não imaginava, também, as diversas áreas da saúde. No mesmo dia em que eu tive a surdez, visitei um otorrinolaringologista (otorrino) e uma fonoaudióloga (fono), foi essa a vez que eu tive o primeiro contato com a fono. Lembro que eu estava muito nervoso com a situação e não conseguia entender, de fato, tudo o que estava acontecendo. Naquela mesma semana eu fui diagnosticado com Neurofibromatose tipo II (NF2), foi aí que tudo começou… As consultas com Fono, Otorrino e neurologista ficaram cada vez mais frequentes. A minha curiosidade para entender essa doença também se despertou. Comecei a procurar muitos artigos sobre a NF2 e surdez e após muito estudo (na época apenas por curiosidade) eu consegui entender a justificativa para a atuação da equipe multidisciplinar. Achei curioso também, o fato de não existir quase nenhum blog abordando essa doença com uma linguagem simples, clara e objetiva. Outro fato que me chamou a atenção, foi que, por mais que eu procurasse, não conseguia achar nenhum outro portador da minha doença para conversar. Foi assim, que eu tive a brilhante ideia de tentar mudar isso e mostrar para o mundo que as pessoas com NF2 existem além de artigos científicos.

Logo na minha primeira consulta com minha fonoaudióloga Valéria, conversamos sobre meu blog e percebi que ela ficou muito feliz com a minha vontade de entender a minha doença e deficiência. Também foi nessa consulta que ela me explicou tudo sobre a surdez e NF2. Isso também aconteceu em 2017, e eu saí de lá com a certeza de que eu deveria continuar escrevendo e pesquisando sobre o assunto. Em 2018, a minha psicóloga, Rosa, me colocou em contato com uma portadora da NF2,. ela se chama Demy (in memorian) foi super simpática e atenciosa comigo, me explicou como era a vivência dela com a NF2 e me colocou em contato com outras pessoas com o mesmo diagnóstico.

De 2017 até 2020 eu operei duas vezes para “ressecar” os schwannomas do VIII par de nervos cranianos, bilateralmente. Eu não parei, em momento algum, de pesquisar e escrever. Eu sempre quis ajudar o próximo e já fazia isso, eu só não tinha percebido que a fono era o meu lugar. Na verdade, eu gosto de falar que a Fono me escolheu, eu sempre mantive essa história em segredo, mas vou trazer a público agora. 

Eu faço o meu tratamento no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), lá é o maior complexo hospitalar da américa latina, então falamos de vários prédios enormes. Um belo dia eu estava saindo de uma consulta e vi um rapaz, com andador, tentando subir as escadas para a clínica de Fonoaudiologia. Eu fui correndo ajudá-lo, e para a minha surpresa ele também era portador da NF2 com uma condição de saúde semelhante à minha. Nós conversamos por algum tempo até ele ser atendido e ali eu senti que algo me tocou, ali eu senti que nasci para a fono.

Assim que eu saí de lá, procurei as universidades que oferecem o curso, olhei as grades e comecei a estudar para o vestibular. Prestei os vestibulares no final de 2020 e ingressei em 2021. Hoje, eu sou aluno da Universidade Estadual Paulista (UNESP), atualmente no 2º ano, e produzo pesquisas na área da audiologia. 

Hoje eu vivo um sonho lá! É um desafio e aprendizado diário para mim e para todos os meus professores. Poder estudar tudo o que a Fonoaudiologia oferece me realiza todos os dias, afinal foram 5 anos pesquisando (de forma amadora) o que eu estudo hoje como aluno de uma conceituada Universidade.

Para concluir, posso dizer que estar do outro lado da mesa, ajudando o próximo, é o sentimento mais gratificante que existe. Às vezes, a vida vira de ponta cabeça, no começo a gente não entende nada, mas após algum tempo as peças se encaixam. Nunca desistam dos seus sonhos! Vivam felizes!

Uma das minhas fotos favoritas da graduação. Máscaras transparentes para leitura labial 😊 Um gesto tão simples que representa tanto!

Um comentário em “Do outro lado da mesa: Como a fonoaudiologia mudou minha vida

  1. Olá muito boa tarde Dr. Gabriel Luiz Vedovato

    Chamo-me Ricardo Miranda, sou o presidente da OUVIR Associação Portuguesa de Portadores de Próteses e Implantes Auditivos, e estou interessado em conhecer mais e melhor acerca da Neurofibromatose II. Porque conheci/conhecemos um caso de uma amiga que também era portadora da mesma doença, e hoje é completamente surda, com baixa autoestima.
    Se poder, envie-nos um email para ouvir.apppia@gmail.com . Podemos ficar com o seu contacto? Que tratamentos para a Neurofibromatose II, existe actualmente? A surdez nestes casos é reversível?

    Muito obrigado pela sua atenção!

    Melhores cumprimentos
    A. Ricardo Miranda

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